quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Em terra de cego, quem tem um olho é rei!

Por Betânia Castoldi, estudante de Relações Públicas da PUCRS e Mateus Martins, estudante de Relações Públicas da UFRGS

Como alcançar a excelência em vendas? Esse foi o tema de mais uma palestra gratuita que aconteceu dia 11 de fevereiro na ESPM-RS. Na verdade foi um bate papo bem informal, uma aula com Flávio Martins, professor, pesquisador e coordenador das áreas de Relacionamento e Corporativa da ESPM-RS. Ele falou sobre a nova fronteira da área comercial, que está hoje baseada em ações de relacionamento e parceria com os clientes. Todo mundo sabe disso...será? Hoje se fala muito em ter foco no cliente, atento às tendências de mercado, e que a chave do sucesso está em entender e atender suas reais necessidades, mas, segundo Flávio, várias empresas continuam errando e mantendo o foco no produto. Tipo a Olivetti, uma indústria fantástica que se preocupou com o produto, e - apesar de ter remodelado seu modelo de negócios - não percebeu o que o mercado apontava e perdeu espaço. Afinal, quem hoje compraria uma máquina de escrever de último tipo? Alguém sabe o que a Olivetti produz hoje?

Outro exemplo citado na aula foi o caso do Zaffari, que nos anos 80, com medo da concorrência, pressionou os vereadores de Porto Alegre a aprovar uma lei que restringia qualquer estabelecimento de varejo na capital a ter no máximo 1.800 m² de área construída. A empresa fez isso com medo da entrada do Walmart no mercado gaúcho. Se o Walmart vier para cá e começar a construir suas lojas gigantes todos os pequenos comércios irão falir, era o argumento usado para convencer os vereadores gaúchos. Nesta época o Walmart ainda construía lojas enormes, mas o Walmart mudou, porque o mercado mudou. O Walmart entendeu e o Zaffari não percebeu que agora há um consumo de conveniência, ou seja, ninguém é cliente somente do Zaffari ou do Nacional, o consumidor compra nos dois, compra na padaria da esquina, também compra na loja AM/PM do posto e no mercadinho na frente de casa. Isso é perceber o mercado! Será que podemos chamar o Zaffari de uma empresa míope? Isso lembra aquela frase Em terra de cego, quem tem um olho é rei. É claro que não podemos chamar o Zaffari dessa maneira, pois hoje é uma rede de grande expansão muito bem posicionada que valoriza o bom atendimento e a oferta qualificada e diversificade de produtos. O Zafarri não é, mas conhecemos muitas que são.

Mas também não faltam empresas e marcas que souberam conquistar o mercado em que atuam, tendo foco exclusivamente no cliente. Flávio nos falou do case nacional Cacau Show, que ao chegar aos 20 anos de fundação, é uma das mais conhecidas redes de venda de chocolate do Brasil. O fundador da rede, Alexandre Tadeu da Costa, que começou do zero, planeja chegar a 1000 lojas em 2010 e marcar presença no exterior a partir de 2011 afirma que o importante é sempre estar se reinventando. A Cacau Show alia o sabor de um chocolate caseiro, com uma forte presença de varejo e um padrão de qualidade controladíssimo. Para dar um exemplo, é requisito básico ter ar condicionado em cada uma das franquias da rede, pois do contrário Alexandre Tadeu afirma sem ar, a loja não inaugura. Ora, por quê? Por que a temperatura é um dos fatores que altera as propriedades na degustação do chocolate. No ano passado, inclusive foi a Cacau Show uma das primeiras a fazer chocolate orgânico no Brasil. Isso é perceber o mercado!



Para Flávio Martins, a Cacau Show é o exemplo brasileiro da espanhola Zara, um dos maiores fenômenos da moda dos dias de hoje. Um dos segredos está na logística: a Zara consegue distribuir produtos um dia depois do pedido ter sido feito pelas lojas da Europa, e dois dias depois no caso das unidades da Ásia e do continente americano (Brasil incluso). E não existem diferenças entre as linhas vendidas em cada um dos lugares – apesar das diferenças culturais, parece que a moda já é globalizada - pelo menos para os clientes da Zara. São novos artigos nas prateleiras duas vezes por semana! São 25 coleções por ano! Toda vez que o comprador vai à loja, sabe que encontrará novidades e o qual é o fator que motiva o consumo de roupas? Novidades, novas coleções. Isso é perceber o mercado!

Mas de nada adianta perceber as tendências, observar o mercado, ter uma estratégia infalível, com diversidade de produtos e ótima logística se o ponto de venda - e o profissional de venda - não estiver em sintonia com o todo o processo. Segundo Flávio, o profissional de vendas precisa ter vivência de mercado, capacidade de entender os consumidores (deve ser por isso que adoram chamar os RRPP’s para trabalharem na área comercial), e flexibilidade e adaptação às mudanças. Inclusive, analistas de tendências afirmam que daqui há 25 anos, 80% dos produtos que estarão sendo comercializados, ainda nem foram inventados. Qual empresa irá produzir estes produtos e qual vendedor irá dominar estes novos mercados?

SEGMENTANDO SEUS CLIENTES
Os clientes querem customização, acessibilidade e facilidade, e podemos ilustrar essas vontades e anseios desse novo e exigente consumidor através do case Havaianas. No pé de operário à madame. Flávio nos contou sobre o episódio de reposicionamento da marca no exterior, quando Ângela Hirata, consultora responsável pelo projeto, citou em uma palestra que recusou a proposta do Walmart, que encomendaria uma quantidade enorme, para vender a sandália na loja, pois se colocasse lá teria que vendê-la a U$ 2 e o produto se tornaria mais um entre tantos já existentes no mercado. Sua estratégia foi a de começar a vendê-las para boutiques em Nova York, em Londres, tendo como garota propaganda a top Gisele Bündchen, agregando valor ao produto. Hoje encontramos modelos Havaianas desde R$ 7,99 para o pedreiro e de até R$ 77,90 para a madame, totalmente customizadas e adequadas a todos os tipos de público. Isso é perceber o mercado!

Esta passagaem do livro A cabeça de Steve Jobs resume bem o pensamento do gênio da Apple: As pessoas não sabem o que querem até você mostrar a elas. Não ouça seus compradores. Eles não sabem o que querem. Como é que eu posso perguntar às pessoas como um computador baseado em uma interface deveria ser, quando elas não têm a menor idéia do que seja um computador baseado em uma interface gráfica? Ninguém jamais viu algo assim. Jobs não consegue inovar perguntando a um grupo de foco o que ele quer - as pessoas não sabem o que querem. Como disse certa vez Henry Ford: Se eu perguntasse a meus clientes o que eles queriam, teriam respondido que era um cavalo mais rápido. Grupos de usuários não são adequados à inovação tecnológica. Eles não podem lhe dizer o que querem. Isso é perceber o mercado!

PROCESSO DE VENDAS
Voltando à palestra. Nela, Flávio nos falou um pouco sobre as ações de up/cross-selling, que além de aumentar as vendas, ajudam a fidelizar, porque são relevantes e entregam conveniência ao cliente. A equipe de vendas deve ter sempre em mente que estes conceitos só funcionam se eles puderem economizar o precioso tempo de seus clientes.

Up Selling (é venda adicional, é uma estratégia de venda na qual o vendedor sugere algo que incremente o produto ou serviço que está sendo comprado). Por exemplo: Atendente do McDonald’s: - O senhor não gostaria de batatas grandes, por apenas R$0,50 a mais?

Cross-Selling (é venda cruzada, é uam estratégia de venda na qual o vendedor sugere produtos complementares). Por exemplo: Atendente do McDonald’s: - Pedido feito, senhor. Acompanha um sundae de morango?

E para exemplificar ainda mais todo esse processo de vendas, Flávio apresentou 2 cases da Dell:

Case 1 – Puro up/cross-selling

Através do site da Dell, é possível comprar computadores personalizados por você, adaptados às suas necessidades e ao seu bolso. O processo de compra é composto de 4 etapas. A partir do momento que o comprador escolhe um modelo pré-configurado, ele passa para a etapa 1 da personalização, onde diversos adicionais são sugeridos. Esta é a fase do Up-Selling. Passando para a etapa 2, já com o notebook configurado, o sistema começa a trabalhar o Cross-Selling, sugerindo produtos complementares. Nesta fase, tão importante quanto aumentar o valor da venda é atender todos os desejos de seus clientes, afinal, uma mochila cai muito bem para que está comprando um notebook, não? Na etapa 3 são oferecidos alguns serviços de manutenção. E para finalizar (etapa 4), o cliente verifica o carrinho e vai ao caixa. Um e-commerce muito inteligente com um forte e relevante uso de Up/Cross-Selling, coisa difícil de ser ver nas lojas digitais.

Clique na imagem para ampliar

Case 2 – Tipos de vendas

A área de TI em vendas da Dell é muito bem planejada e eficiente. Em cada ilha de cada atendente de telemarketing fica disponível todo o material/anúncio que foi publicado no dia, com todas as possíveis combinações/combos de acessórios para as máquinas. A Dell trabalha suas vendas de forma transacional e consultiva. Na transacional o consumidor vê o anúncio no jornal ou na TV e liga para a empresa, a venda é direta e o vendedor é apenas o facilitador. Na consultiva são feitas prospecções e visitas a grandes empresas, a venda é corporativa, e o vendedor é um consultor dos produtos e serviços da Dell para a empresa que quer fechar o negócio.

CARACTERÍSTICAS DO PROFISSIONAL DE VENDAS
No final da palestra, apesar de tangibilizar sobre diversos assuntos em 1 hora e meia, Flávio ainda mostrou qual a fórmula mágica de sucesso em vendas para um profissional. Ele precisa ter duas características essenciais: EMPATIA E TÔNUS VITAL.

Empatia: capacidade de sentir como a outra pessoa sente, é diferente de simpatia que é ser cortês e agradável, pois pode ser um vendedor muito simpático e não conseguir vender nada. É preciso encantar, envolver-se, provocar respostas e posturas positivas. É preciso fazer as perguntas certas, vendedor escuta e não fala, é preciso ter time para a negociação, mostrar interesse.

Tônus Vital: é preciso relacionar-se com outros vendedores, conhecer os egos, o lado interior. O vendedor é despertado não só pelo dinheiro, mas pela vontade de conquista. E o mais importante é a capacidade de assimilar a derrota, e retomar ao objetivo almejado. Ao receber uma resposta negativa, ir receber o feedback pessoalmente do cliente, por dois motivos: 1. Aprender o que fez de errado e 2. Deixar o cliente perto, para que quando ele trocar de fornecedor, contrate você.

"Na área de vendas, você que faz seu destino, finaliza Flávio Martins.

Para quem gosta e deseja atuar na área de vendas/comercial, é necessário ter motivação, valores fortemente estabelecidos, pois se trata de uma área muito sensível, onde é preciso avaliar o mercado, trabalhar a equipe com metas desafiadoras e não impossíveis, e ter um foco. Pergunte a você e à sua equipe: Quem somos, o que queremos, onde somos bons? Que tipo de valor estamos vendendo? Temos capacidade de entregar esse valor? Que tipo de valor o mercado está buscando? Além de identificar o perfil do seu cliente, as funcionalidades do produto, entenda o mercado!

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